Da Escola virtual à virtualidade da Escola
Rogério Manita e Sousa1
Enviou o ME às Escolas orientações que tudo dizem sobre o que quer fazer.
Primeiramente há que dizer que não existirá problema, salvo raras exceções, em instalar as turmas em salas distanciadas, bastando para isso definir aulas para as turmas do Secundário também em Escolas do EB 2, 3 que estejam disponíveis.
Por outro lado, também se saberá que estarão identificados percursos para o Gabinete/Sala de isolamento para os casos de necessidade e que já se privilegia a via digital para os necessários procedimentos administrativos.
Igualmente estarão definidos procedimentos para os refeitórios, nomeadamente para os que já se encontram em utilização e que se manterão abertas as portas dos vários recintos, pelo que estas orientações serão para compor o documento.
O mesmo se dirá da afirmação que determina dever ser criada/reforçada a equipa de Educação para a Saúde, para em ponto ulterior se afirmar que deve ser assegurada a presença dos recursos humanos estritamente necessários…
Já não será tão fácil assim definir circuitos e procedimentos no interior da Escola que promovam o distanciamento físico entre alunos, nomeadamente no usufruto dos espaços comuns e nas idas à casa-de-banho.
A ideia de fechar bares e salas de apoio é possível, mas resta saber como é que um aluno pode permanecer na Escola durante o tempo que lhe for exigido.
E daqui decorrerá o primeiro problema:
Quem definiu o horário nem saberá do que fala!
Tomemos como exemplo as turmas dos Cursos de Ciências e Tecnologias.
Se tivermos em conta o 11.º ano sabe-se que os alunos poderão ter, por exemplo, as disciplinas de Biologia e Geologia e de Física e Química.
Cada uma destas disciplinas tem uma carga horária para o aluno de 7h.
Se, como se determina, houver apenas um aluno por secretária, certamente que as turmas terão de ser desdobradas e existirão 3,5h para cada metade da turma, o que leva a que as 7h definidas (10-17h) não sejam suficientes.
Haverá, no mínimo, confluência de alunos na mudança de turnos.
E alguém espera que a redução de intervalos seja mesmo levada a zero, obrigando alunos e professores a ter aulas de 3,5h? Isto, recorde-se, quando todo o apoio será inexistente na Escola para alunos, professores e demais funcionários…
Para além do necessário alargamento de horário tal quererá dizer que os alunos, para terem os tempos definidos, terão que ir à Escola, pelo menos, 4 vezes por semana.
Quase o mesmo se passará quanto ao 12.º ano que tem 6h de Matemática e 5h de Português, o que diz tudo quanto ao concentrar das aulas das diferentes disciplinas e das diferentes turmas…
E faltará a cereja no topo do bolo!
Analisemos, pragmaticamente, a questão dos docentes necessários.
De facto, pressupõe-se que pode haver desdobramento das turmas pelo recurso a professores com disponibilidade na sua componente letiva.
O problema da falta de docentes tem sido recorrente, nomeadamente quando se pretende substituir professores não colocados em sucessivos concursos.
Agora o ME quer que existam nas Escolas, neste momento, professores com disponibilidade na componente letiva!
É que, voltemos ao exemplo antes referido, os professores que darão aulas às turmas tomadas como exemplo não terão disponibilidade para dar o dobro do tempo de aulas, 14h, 12h, 10h a cada uma das turmas, como será evidente…
Mais, sabe-se que neste nível de ensino os docentes serão dos mais velhos dos já muito idosos componentes da classe docente.
Embora se tenha alertado vezes sem conta os responsáveis pela manutenção desta situação na profissão docente todos sabem o qual foi a política seguida pelo ME.
As consequências aí estarão e existem culpados!
Pretende-se para as turmas com professores, a maioria dos quais para lá da casa dos sessenta anos, que pertençam a um grupo de risco que aqueles mantenham as aulas em sistema remoto, tendo a coadjuvação presencial de outros docentes com disponibilidade.
Ou seja, na impossibilidade real de isso ocorrer, face à inexistência de professores, tudo ficará na mesma!
Como resulta das orientações ministeriais, as Escolas poderão sempre adotar outras estratégias para substituir professores, percebendo-se que isto é algo que o ME não pode determinar porque não existem soluções mágicas.
Trata-se, afinal, de mais um faz-de-conta:
Se até aqui se fazia de conta que havia Ensino à Distância e não, como na verdade acontecia, Ensino Remoto de Emergência, agora pretende-se fazer de conta que vão ocorrer todas as aulas presenciais devidas aos alunos dos 11.º e 12.º anos.
Como sempre, cada um acreditará no que entende ser a realidade.
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1Biólogo, Mestre em OT e Planeamento Ambiental, Doutorado em Educação, Professor do EBS.